uma grande, enorme, imensa (era realmente gigante) ficha caiu por aqui.
você é da época que entende essa referência?
esses dias, uma grande, enorme, imensa (era realmente gigante) ficha caiu por aqui. mas antes de te contar: será que os jovens entendem a referência da expressão “cair a ficha”? tudo mudou tão rápido que ainda sou jovem e o mundo que eu vivi da infância ao início da vida adulta não existe mais.
a última vez que usei um orelhão foi quando fui assaltada, roubaram meu celular e eu precisei avisar meus pais. eu acho que era 2012, ou 2013. 901519… era assim que eu começava a ligar quando não estava em Limeira. e, sim, eu SEMPRE liguei a cobrar pra casa dos orelhões. a musiquinha danada acaba de tocar na minha mente enquanto te escrevo e eu espero que ela não fique por muito tempo…
quando eu era essa pequena jovem que ligava a cobrar, lá pelos meus 12, 13 anos, eu tinha muita vontade de sair à noite. como toda pré-adolescente com os hormônios começando a dar as caras, eu queria muito sentar num barzinho com as minhas amigas, pedir um suco de laranja e me sentir descolada. também queria muito ir aos shows e ao Baile do Havaí que rolavam no Nosso Clube e na La Chouette, a balada descolada do momento (que também ficava no Nosso Clube).
o único empecilho tinha 1,58m, cabelos cacheados e respondia pelo nome de “mamãe”. eu sou filha do segundo casamento do meu pai. tenho uma irmã mais velha que era tão baladeira que tinha o apelido MARAVILHOSO de Jananight. meu pai já estava acostumado em ter uma pequena adolescente doida pra sair de casa e sinto que, por ele, eu iria. mas sempre que eu pedia qualquer coisa do tipo pra ele, vinha o clássico “pergunta pra sua mãe” como resposta.
minha mãe não queria que eu saísse de casa antes dos 14 anos. quer dizer, não queria que eu saísse para baladas e bares. eu podia ir ao cinema, ao shopping, às casas das minhas amigas… menos para os eventos noturnos do Nosso Clube que eu, obviamente, morria de vontade de ir.
aquela menina ali da foto pedia, implorava, argumentava, chorava. e nada funcionava. as respostas começavam com “porque você não tem idade, filha” e terminavam com um “porque eu não quero e ACABOU. chega! se você falar mais uma vez nesse assunto, não vai pra lugar nenhum”. eu ia resmungando pro meu quarto, p da vida.
depois que eu me acalmava, minha mãe sempre me dizia a fatídica frase: “eu não vou deixar você perder nenhuma festa imperdível”.
e foi me lembrar de tudo isso que fez a grande, enorme e imensa ficha cair.
pouco tempo atrás, minha mãe me disse: “lembra que eu falava que não ia deixar você perder nenhuma festa imperdível? hoje você concorda, né?”. eu ri e respondi: “sim e não. eu acho que você fez bem em me permitir ser criança por mais tempo. maaaas, eu perdi, sim, muitas festas imperdíveis! porque aos 12, 13 anos elas eram imperdíveis e eu não pude ir”.
não é porque entendemos as motivações na vida adulta que todo o sofrimento da pequena adolescente desaparece, né? ela sentiu. ficou triste e com raiva no quarto escutando Avril Lavigne muitas vezes. e dia desses, mais precisamente semana passada, eu me senti exatamente como ela. e foi aí que a grande, enorme e imensa ficha caiu.
eu tô com 33 anos e vivendo meu ano 5, na numerologia. um ano de mudanças e aventuras. no meu último ano 5, eu estava morando sozinha e experimentando muitas coisas novas. vivendo de pequenas paixões, muitas decepções, ressacas e pequenas aventuras.
quando eu soube que iniciaria mais uma no 5, confesso que criei algumas expectativas. estava (e talvez ainda esteja) esperando grandes mudanças! ser chamada pra dar entrevista num grande podcast e BUM! minha vida mudar? palestrar no TEDx? lançar um livro?
como nada disso foi acontecendo, comecei a pensar: “e se eu pegasse todo o dinheiro da minha reserva e fosse viajar com o Lucas?”, “e se eu decorasse todo meu escritório do zero? comprasse tudo novo?”, “e se eu…” foram muitas sugestões. para todas eu respondi: “não é uma boa hora pra isso. a gente precisa do dinheiro da reserva. precisamos de um carro, lembra? a gente tem planos maiores dessa vez…”
planos esses que eu ainda não posso tirar do papel. preciso de mais tempo e planejamento pra isso. preciso esperar. preciso ter paciência. e numa tarde de tpm enquanto conversava com o Lucas, a grande, enorme e imensa ficha caiu:
“meu Deus!!! eu tô fazendo comigo o que minha mãe fazia!!! eu não tô me deixando fazer as coisas porque ainda não é a hora e alguma coisa dentro de mim está MUITO brava com isso. eu me tornei a mãe chata de mim mesma!!!”
foi um choque. e uma resposta certeira pra sensação que eu andava tendo. eu estava me sentindo presa. todos os dias. uma vontade de sair, de gritar, de correr, de me jogar no mundo, na vida e alguém me dizendo “não é hora”.
eu entendi o momento-entre que eu me encontro.
um pé na jovem aventureira e inconsequente, o outro na mulher que está desejosa por se tornar mãe.
percebi que todas as escolhas que tenho feito são para me levar até esse objetivo. tenho repensado o modo como trabalho, como cuido da minha casa, do meu corpo, do meu dinheiro. tenho falado mais sobre isso com Lucas e tenho pensado em marcar um exame de contagem de óvulos.
penso diariamente em que nome darei pra ela. ou ele? segundo minha mãe, é ela. Agnes? Sara? Lenú? eu queria Mavie, mas a filha do Neymar nasceu primeiro e não sei o quanto gosto dessa associação…
“Ynara, pelo amor de Deus! por que pensar nisso agora?” eu nunca sei responder essa. mas talvez porque quando nomeamos as coisas, elas se tornam mais reais.
estou dividida em duas. uma que se delicia em imaginar esse possível futuro e sente prazer em ser paciente e não se atirar na vida. outra que se sente perdendo tempo e oportunidade e que lamenta profundamente o que nunca mais poderá viver.
eu sinto um luto profundo pelas coisas que não fiz com 20 e poucos e que hoje não parecem mais possíveis. e eu sei, sei mesmo, que talvez isso nem seja verdade. eu vou poder fazer muito mais do que consigo imaginar. mas quem sofre é aquela adolescente dramática que ainda mora aqui. aquela que é cheia de sonhos inconsequentes e dignos de cinema.
na newsletter passada, eu escrevi: “hoje entendo muito meus pais. era bem gostoso quando as escolhas não vinham atreladas a consequências.”
eu estou me deixando perder algumas festas imperdíveis.
eu sou mãe e filha. uma em paz, a outra em luto. o medo de uma, a frustração da outra. a ansiedade de uma, a revolta da outra. as duas em mim, causando reboliço. a famosa transição de donzela para mãe.
desde que a grande, enorme e imensa ficha caiu, conduzo as duas pra Velha que me guia. só ela acalma o agito barulhento da juventude.
eu sei que lá na frente vai valer a pena. assim como minha mãe sabia. eu sei que surgirão festas muuuuuito mais gostosas do que as da La Chouette. mas hoje eu ainda tenho que lidar com uma adolescente trancada no quarto ouvindo Avril Lavigne no último volume.
“to walk within the lines
would make my life so boring
i want to know that i have been to the extreme”
(andar na linha faria minha vida muito chata.
eu quero saber que eu fui ao extremo)
antes que eu me esqueça…
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curadoria da semana:
a verdade é que estou obcecada pelos vídeos de coletiva de imprensa do filme “Todo Tempo Que Temos” com a minha musa Florence Pugh e o maravilhoso Andrew Garfield. pensando nisso, vou te indicar 3 filmes protagonizados por eles.
Tick Tick… Boom! está disponível na Netflix e conta a história do compositor Jonathan Larson, criador do famoso musical Rent. esse filme é tão, mas tão bonito! Andrew está perfeito como ator. mas ó, é triste. sempre bom avisar. mas vale cada minuto!
Uma Boa Pessoa tem uma das cenas que mais mexeram comigo na vida. uma cena simples, onde a personagem da Florence Pugh está dando seu depoimento no Narcóticos Anônimos. a hora que ela diz “eu nunca tinha dito isso em voz alta” é o olhar mais verdadeiro que eu já vi em cena, sem exagero. me arrepiou, me arrebatou. eu assisti esse pedaço inúmeras vezes! e ó: o filme também é triste. sempre bom avisar. mas vale cada minuto!
Don’t Worry Darling é polêmico. tem gente que ama, tem gente que acha terrível de ruim. eu amo! mesmo o Harry Styles (belíssimo) sendo um ator muito cru perto da imensidão que é a Florence, não atrapalha a experiência. porque o foco é nela! e, olha… esse filme mexeu demais comigo. fiquei chocada, revoltada, indignada. esse não é triste. é revoltante! sempre bom avisar. mas vale cada minuto!
Te lendo eu voltei lá na infância e adolescência e lembrei não só de muitos nãos da minha mãe mas também de alguns tantos sim que apareciam no lugar, tipo: não pode ir na casa da amiguinha mas pode tirar todas as almofadas de todos os sofás, pegar travesseiros, lençóis e fazer uma cabaninha dessas que tira tudo do lugar, sabe? E aí pensei que se eu soubesse que iria engravidar ou se tivesse planejado uma data para começar a tentar, o que eu faria de diferente nos meses/anos que antecedem a realização desse sonho, seria me dar um monte de sim’s de presente junto com os nãos que precisam ser ditos: vivendo uma “despedida de donzela” intencional. Esses sim’s seriam simples, nada que comprometesse a minha preparação estratégica para o que estar por vir. Faria minhas unhas com mais frequência, me permitiria dormir até mais tarde mais vezes, encheria meu corpo de mimos e amor, cuidaria do meu assoalho pélvico para não ter que me preocupar com isso durante a gravidez, comeria mais peixe cru, me deliciaria em vinhos - sei lá, me daria os sim’s que são não’s durante a gravidez, amamentação e os primeiros anos caóticos do maternar.
Amo te ler, já te falei isso? ❤️
Todas elas sempre vão existir em nós né? A adolescente desejante, a madura responsável, a que sabe… Cada hora uma falando mais alto que a outra. Mas tem sims que são mais queridos que outros e estes sempre vão ganhar. Quando meu sim pra maternar uma alminha totalmente dependente ganhou, acalmei as outras lembrando que também será uma fase e que vai passar tão rápido, que os outros sims podem esperar. Eles terão muita vida pra serem vividos ainda… não é sobre idade, é sobre desejo… Qual sim tá mais forte aí? Deve ser a hora dele…