o Oscar não valida o talento de ninguém.
mas reconhece. e isso é um grande motivo de celebração.
te escrevo esse texto do passado. eu não sei se ganhamos ou perdemos o Oscar. eu não sei se chorei de alegria ou decepção. tô ainda aqui no campo da esperança, sentindo as borboletas da expectativa tomarem conta do meu corpo.
e para aliviar e contribuir com o clima, escolhi escrever sobre uma coisa considerada por muitos desnecessária e por tantos um objetivo: o reconhecimento.
mas antes, se você está me lendo do seu e-mail, considere baixar o app do substack no seu celular ou tablet. a leitura fica ainda mais confortável e ritualística.
um dia, que não foi um dia qualquer já que eu estava em Lisboa jantando com amigos, o pai do anfitrião me fez uma pergunta que até hoje, 6 anos depois, ecoa na minha mente.
se eu não me engano, falávamos sobre Camille Claudel e sobre ela não ter tido o mesmo reconhecimento de Rodin no seu trabalho (se quiser saber mais sobre essa história, contei aqui). eu dizia no meu tom revoltado dos 20 tantos anos o quanto eu considerava um absurdo as pessoas não terem o reconhecimento que merecem. principalmente mulheres. o quanto era revoltante que morrêssemos esquecidas enquanto homens são eternizados em livros e estátuas de bronze.
o pai do meu amigo me olhou fundo nos olhos e perguntou: por que o reconhecimento é tão importante pra você?
eu não lembro o que respondi. deve ter sido algo genérico como porque é justo. mas ele sabia o que me perguntava e também sabia que qualquer resposta que viesse dali não seria 100% honesta. eu também sabia, já que me percebi bicho assustado internamente, tentando não dar o braço a torcer do lado de fora.
essa pergunta fez morada em mim. e a primeira coisa que tive que entender é que durante muito tempo eu não busquei reconhecimento, eu busquei validação.
o poder de usar a palavra certa
vejo em comentários de conteúdos e entrevistas sobre o Oscar pessoas dizendo que não deveríamos dar tanta importância para premiações gringas. Fernanda Torres e Ainda Estou Aqui já são fantásticos mesmo sem o prêmio. é verdade. porque o prêmio não valida o talento da atriz e a qualidade do filme. ele reconhece.
durante a maior parte da minha existência o que eu busquei foi validação. pra você ter uma ideia, passei pelo processo seletivo de uma grande escola de teatro liderada por um dos maiores diretores do Brasil, o CPT de Antunes Filho, mesmo sem me identificar com o estilo do trabalho.
me dediquei e atravessei todas as etapas. me apresentei duas vezes para Antunes, fui aprovada por ele e não vivi os 4 meses de curso. a única coisa que eu estava buscando era validação. eu só queria que alguém de fora, alguém de renome, me dissesse para continuar. mas é claro que eu só fui entender isso anos depois.
quando criança, eu precisava vestir as roupas novas que comprava e desfilar para o meu pai ver uma por uma. porque eu queria ver através do olhar dele se eu tinha feito boas escolhas ou não. hoje, ainda faço isso com o Lucas (porque continuo exibida), mas já sustento meu gosto caso ele “desaprove”.
uma vez um carinha de quem eu gostava no trabalho me disse que o batom roxo que eu amava era feio. “parece que você está com hipotermia”, disse ele. eu nunca mais usei o batom.
isso é busca por validação. acreditar que o que você gosta, faz, cria só tem valor quando o outro dá o like e compartilha. e a gente precisa buscar incansavelmente por ela quando nós mesmas não sentimos que ser quem somos e criar o que criamos é valioso.
reconhecimento é diferente.
você dedica o seu tempo, seu conhecimento e seu corpo para criar algo. você se entrega e aquilo se torna a sua vida por um tempo. você testa, erra, acerta e vive aquele caos do processo criativo que vai do céu ao inferno e de volta ao céu em frações de segundos. e então, voilà, você está pronta para a estreia.
eu duvido com todas as minhas forças que você não quer receber nada em troca. eu duvido de qualquer pessoa que venha me dizer que passa por todo esse trabalho por pura satisfação pessoal. honestamente? o tipo de coisa que eu faço única e exclusivamente por satisfação pessoal é tomar meu vinho branco na praia num dia de calor.
receber uma indicação ao Oscar por um trabalho que você passou anos se dedicando e acredita na força dele é reconhecimento. receber um prêmio pelo livro que você passou anos escrevendo é reconhecimento. receber o depoimentos de alunos/mentorados/seguidores/leitores que foram transformados pelo seu trabalho é reconhecimento. ser bem paga para fazer o que você faz de melhor é reconhecimento. perceber que seus filhos se tornam cada vez mais pessoas íntegras e comprometidas com a vida é reconhecimento.
e se você me disse que você não quer nada disso, eu sinto muito, mas eu não vou acreditar em você. e vou além: vou te dizer que você diz que não quer porque no fundo não sente que merece. porque você aprendeu a ser modesta, a se doar incondicionalmente sem esperar nada em troca e mesmo frustrada com a indiferença das pessoas diante do seu feito, você se recolhe e diz: “a minha intenção nunca foi receber nada por isso, eu faço porque gosto”.
é mentira e você sabe.
minha mãe ama cozinhar. é sua paixão e ela faz com maestria. um dos dias mais felizes da vida dela foi um almoço em família na minha casa onde a mesa inteira parou para aplaudi-la e agradecer pela comida. ela foi vista. reconheceram o trabalho dela. e essa é uma sensação inesquecível.
dizer que o reconhecimento não é necessário beira a arrogância. é como se nos afastássemos da vida em sociedade e disséssemos que o outro não importa. tá tudo bem não fazer da opinião do outro o centro das suas escolhas. é realmente a coisa mais saudável a se fazer. mas se alienar do coletivo e achar que só você basta para si é igualmente enlouquecedor.
lembra? validação não é o mesmo que reconhecimento.
é, sim, uma linha bem tênue essa dança de se perceber enquanto indivíduo e ser social. mas é preciso bailar!
eu espero com todos os meus poros que o prêmio tenha vindo pro Brasil. eu espero ter visto e me emocionado com os brasileiros no palco comemorando a vitória. assim como eu espero comemorar as minhas vitórias, sejam elas quais forem e ser a primeira a reconhecer minha trajetória com palavras de incentivo e amor.
e eu espero ainda mais que esse texto tenha remexido suas águas internas. eu não escrevo apenas porque preciso. eu escrevo também para ser lida por você. por isso, muito grata por ter chegado até aqui.
como diria Caetano: “gente é pra brilhar, não pra morrer de fome”.
antes que eu me esqueça…
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curadoria da semana:
🎧no episódio passado do podcast, eu te conto sem romantizar sobre como foi “largar tudo” e vir morar no Rosa
🎬das entrevistas que Fernanda Torres e Walter Salles deram na gringa, essa foi uma das minhas preferidas
📚terminei de ler Tudo Sobre o Amor da Bell Hooks e recomendo demais. é um livro que renova nossas esperanças na vida.
Yna, obrigada pelas palavras inspiradoras de sempre :) Ao terminar de ler o seu texto, acho que consegui concluir melhor o meu, que não fala exatamente sobre reconhecimento, mas sobre também vermos valor na simplicidade. E essa elegância, acredito eu, Fernanda Torres transborda, e aprendi muito com as entrevistas dela! A que vc compartilhou também está entre minhas favoritas ;)
Verdades gostosas de ler no café da manhã desta segunda em que o cinema brasileiro foi reconhecido! ✨ vamos brilhar, porque mesmo que a opinião do outro não seja o centro e o farol e o destino, é bonito tocar outras vidas! Um beijo!