1980, Austrália.
dois artistas completamente apaixonados decidem se casar numa performance emblemática: percorrer a Grande Muralha da China, cada um partindo de uma ponto, e realizar a celebração ao se encontrarem no centro.
1988, China.
dois artistas caminham um em direção ao outro pela Grande Muralha. ao se encontrarem no centro, se despedem para sempre do que, um dia, foi um grande amor.
“Ulay e eu tínhamos estado juntos, como colaboradores e amantes, por doze anos. eu disse a meus amigos que sofreria por causa dele, no mínimo, por metade desse tempo”
Marina Abramovic, em seu livro Pelas Paredes, conta todos os detalhes da performance The Lovers: The Great Wall Walk. mas mais do que isso, ela nos conta tudo o que é sentido quando se caminha em direção ao fim.
o que acho estranhamente bonito é que o caminho de onde ela partiu era tortuoso, difícil e assustador, enquanto o dele, era plano e tranquilo. e isso simboliza perfeitamente como cada um estava lidando com a separação.
ontem, finalmente assisti o belíssimo filme Vidas Passadas e assim que os créditos começaram a subir, a performance de Marina e Ulay me veio à mente.
no filme, Nora é uma imigrante coreana morando em Nova York que um dia decide procurar seu amor de infância no Facebook, depois de 12 anos sem saber absolutamente nada sobre ele.
pode ser que eu esteja chovendo no molhado ao dizer que, pra mim, Nora queria mesmo era resgatar suas origens e lembrar-se de quem foi. estava há tanto tempo longe da Coréia que a cultura ocidental já havia mudado seus costumes, gostos, sotaque…
talvez, para seguir adiante, seja realmente preciso resgatar quem um dia se foi. não para voltar ao passado, mas para estar ainda mais segura das escolhas do presente.
e como é difícil nos despedirmos de partes de nós!
morremos inúmeras vezes ao longo da vida. atravessamos muralhas para nos despedirmos de amores, crenças, sonhos, dúvidas, convicções, dores e chegamos do outro lado com dificuldade de nos reconhecermos sem tudo o que nos definia antes.
e aí a vontade de voltar e pegar de volta tudo o que um dia foi você, aparece. mas são pouquíssimas as coisas deixadas para trás que ainda te servem. talvez somente aquelas que foram arrancadas de você sem que percebesse, mas não as que voluntariamente você deixou pelo caminho.
Marina trilhou um caminho muito mais tortuoso por ter consciência de que a cada passo que dava para frente, um pedaço de si ficava para trás. da mesma forma, o choro de Nora na última cena é de quem, finalmente, está sentindo o luto pela pequena garota de 12 anos que ficou na Coréia.
quando eu tinha 20 anos, pensei que seria uma boa ideia voltar a me relacionar com o amor da minha garota de 15. a imagem que eu tinha na cabeça era da forte atração que a adolescente que fui sentia e dos episódios românticos que ele protagonizou — como escrever “eu te amo” em todas as páginas da minha apostila.
nos reencontramos como quem esperava rever aqueles dois serezinhos despreocupados e intensamente apaixonados que fomos.
mas eles não estavam lá há muito tempo.
aos 20 anos, eu não soube me despedir e simplesmente parei de responder. eu não entendia bem a frustração que sentia e acredito que eu tenha entendido apenas ontem, assistindo a história de Nora. 14 anos atrás eu entendi, inconscientemente, que não era possível voltar, a escolha já havia sido feita. para ele, eu era a pessoa que ia embora. e vice-versa.
aos 34, olho meus olhos no espelho e encaro essa que escolhe ficar. fruto do que fui, tudo o que sou e prenúncio do que serei.
para você que me lê, desejo que se lembre que a força que busca te encontra na travessia, não antes dela. e que despedir-se é permitir que quem você se tornou exista por inteiro.
por isso, despeça-se quantas vezes for preciso. é essa coragem de ir embora tantas que fará com que ficar seja, realmente, a melhor escolha.
depois de um não-tão-breve hiato, abro novamente as portas da minha mentoria numa versão especial para o final do ano. vamos trabalhar sua estratégia de comunicação em 8 encontros individuais — da mente ao conteúdo. serão apenas 3 vagas! para conhecer os detalhes, acesse aqui e agende um bate-papo gratuito comigo. afinal, nenhuma boa relação começa sem um primeiro encontro!
curadoria da semana
🎧essa entrevista da Paola Carosella para a Tati Bernardi mexeu comigo. fui esperando uma fofoca e recebi uma lição de vida.
🎬além do filme Vidas Passadas, recomendo muito A Pior Pessoa do Mundo
📚esse texto da
para a é tão bonito